26 fevereiro 2006

O Oscar 2006- crítica dos filmes que concorrem a melhor direção e melhor filme


Tendo em vista a entrega do Oscar 2006 prestes a ocorrer, não exitei em precorrer os cinemas da minha cidade para assistir os lançamentos que concorrem ao Oscar de melhor filme e coincidentemente de melhor diretor, visto que todos os filmes indicados para melhor filme esse ano também concorrem ao prêmio de melhor Direção.

O Oscar não me oferecia interesse até o ano de 94 quando um filme despertou-me para que eu torcesse por ele. Que filme seria esse? Nada mais nada menos que "A lista de Shindler" de Steven Spilberg. Esse aparece coincidentemente esse ano com seu Munique.

O que devo falar sobre os filmes que concorrem a premiação deste ano? Gostei muito do Segredo de Brokeback Mountain de Ang Lee e Munique de Steven Spilberg, para mim foram os melhores e correm na frente. Gostei também da simplicidade de Boa noite e boa sorte de George Clonney digestivel e fácil de assistir. Achei bom o filme Capote de Benett Miller e torci o nariz para Crash- no Limite de Paul Higes.

Logo se segue as críticas dos respectivos filmes e as minhas impressões sobre os mesmos, com relação a entrega do Oscar, as preferências de cada um só serão confirmadas na abertura dos envelopes. Enquanto isso, é fazer figa. E que vença o melhor!

CRASH- no limite
O diretor Paul Higes faz um apanhado sobre as diversidades étnicas dos EUA. Os personagens se cruzam através de um roubo de um carro de uma mulher de classe abastada, interpretada por Sandra Bulock (que tem um bom desempenho como uma burguesa mimada). O argumento a princípio parece oportuno, no entanto, tudo parece falso, desde algumas interpretações sofríveis de alguns atores até alguns diálogos tão premeditados que o roteirista parece que trata o espectador como se tivesse um atraso mental. As emoções são tão planejadas em cada cena, tão arranjadas, que quando acontece alguma coisa no filme você acaba se sentindo enganado. Talvez seja isso, o filme não é de todo ruim é até original e divertido, mas nunca se firma como uma película feita com seriedade e dirigida com mais segurança. Podemos comparar esse filme, como um carro top de linha que quando sai da fábrica, vai se desmontando pelo caminho. Diálogos como sou negro meu irmão, os brancos querem nosso mal e o velho peixe vendido com todos os clichês de frases ruim e mal acabadas. A trilha sonora é colocada nos momentos mais indevidos principalmente na hora de uma cena sentimentalista, vai aumentando a música de fundo e o público acaba sabendo que a razão toda do Diretor é querer provocar sensações de modo manipulativo. O final parece que foi feito por um adolescente na ânsia de fechar com chave de ouro. Na verdade é uma idéia que absorve mais não convence e mesmo assim continua martelando não pelo que foi, mas pelo que poderia ter sido.

O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN
Surpreendente filme do Diretor Ang Lee que utiliza uma narrativa simples, com fotografia crua, tal como a montagem, trilha sonora e atuações exelentes. O que torna o filme importante em torno da sua simplicidade extética natural (sem muitas firulas), não é nem o modo ou o tema em si que já fora mostrado em outros filmes, mas certamente, o objeto da reflexão que esse levanta no final, a intolerância. Esse filme pode facilmente ser comparado com películas como "Beleza Americana", "Meninos não choram", "Perdidos na noite" e outros que ousaram em sua temática para arrebatar prêmios e se tornarem ícones da história do cinema. Contudo a chave do filme fica por conta das interpretações do elenco, Heath Ledger interpreta Ennie del mar, um sujeito tímido que se contrapõe ao tipo de Jake Gyllenhal (Jack Twist) esse último mais extrovertido que o primeiro e revela um temperamento sexual mais passivo. As personalidades contrapostas fluem no roteiro que é encabeçado por outras atuações não menos brilhantes. Como a noiva de Del mar Alma (Michelle Williams) está perfeita na posição de esposa traída, na cena, por exemplo, em que ela vê o seu marido da janela beijando o seu suposto amigo, sua expressão é tão sincera que é impossível o público não rir da coitada em determinado momento. A ela só resta se submeter à situação visto que não está preparada para encarar o fato abertamente, a princípio, tranca o problema no baú, expondo a questão somente mais tarde. O filme, como muitos críticos disseram está longe de levantar bandeiras e de definir um grupo para qual esteja direcionado. Mesmo porque, antes de um filme de amor entre iguais trata de questões inerentes a uma sociedade escondida nas suas próprias leis. Contudo há uma frase crucial jogada no final do filme e que de certa maneira cria interrogativas, Del Mar fala "Eu Juro!" Ele jura o quê, pois não remete a nenhum acontecimento próximo na montagem ou edição do filme. Será, fidelidade? Amor eterno? Que o corpo do seu amante será removido para Brokeback Mountain? Que um dia se perdoará de ser o que é? Essas simples palavras deixam um manancial de interrogativas, que por circunstâncias próprias até fazem o filme funcionar em seu próprio modo, deixando-o após a projeção em sua mente. Por isso o filme é Altamente Recomendado.


MUNIQUE
Talvez seja o filme mais pomposo de Spilberg desde A Lista de Shindler. Uma mistura de Coppola com Scorsese. O tal filme maduro que todos queriam que o Diretor fizesse. Bem menos apelativo emocionalmente apesar do seu discurso e idéias complexas. Deixa indagações tipo: como um homem, pai de família antes apaixonado, agora luta contra si próprio e consegue fazer amor com sua mulher, amor que simboliza a vida e pensar ao mesmo tempo nas cenas de morte dos seus compatriotas nas Olimpiadas de Munique? O filme trata sobre o terrorismo, enfatizando o setembro negro em que 11 atletas Israelenses foram mortos. Spilberg não se preocupa depois disso em situar personagens, vai jogando na tela um batalhão deles e fica por vezes difícil saber quem é quem. Ele não fornece durante uma boa parte da projeção trégua para o público refletir em cima de seus personagens ou cenas, pois há poucas pausas e existe longos trechos verborrágicos que exigem paciência e atenção por parte do expectador. Se fossemos comparar com uma mulher a Munique do Diretor Spilberg precisaria de uma lipo para ficar mais enxuta. Prevemos o final do filme umas duas vezes para ouvir personagens falarem coisas tipo, isso foi necessário para sua família, todo mundo precisa de um lugar que se possa chamar de seu e um patriotismo exacerbado. O que Spilberg quer mostrar é que os povos, tanto israelenses como palestinos lutam porque querem sua terra e que há motivos mais obscuros por trás das verdadeiras necessidades de se exterminar o “mal”. Motivos esses político-econômicos. Mas a mistura de árabes, com palestinos, terroristas, israelenses, americanos, europeus, soviéticos em locações da Europa (principalmente) vira uma salada e consome tantas idéias e indagações num só filme que você acaba saindo do cinema esgotado e sem acréscimo de fatos realmente novos. O filme está longe de ser chato, principalmente se analisarmos o contexto super atual dos acontecimentos, também, porque as explosões das bombas e dos tiros das metralhadoras dos israelenses quando esses escalados saem a caçar os supostos envolvidos com o terrorismo, ficam zunindo no ouvido impedindo alguém de cochilar. Spilberg pretende fornecer dados históricos procurando explicar os motivos que levaram o terrorismo a se multiplicar (mata um, nasce seis). Quanto aos aspectos técnicos do filme, esse não deixa nada a dever, pois se trata de uma superprodução com pouca utilização de artificialismos baratos que são utilizados hoje em dia em várias produções de forma vulgar (cito os efeitos especiais por computação gráfica). A grandiosidade das imagens que são evidenciadas são de brilhante crueza e realismo, até mesmo pela fotografia que lembra as películas utilizadas nos filmes do começo dos anos 70. Quanto as ótimas interpretações dos atores, estas são embotadas pelo excesso de personagens e pela própria direção que é a verdadeira estrela do filme. A ironia da produção fica por conta da cena em que lados opostos brigam pelo controle de um rádio em que estações diferentes tocam musicas folclóricas de seus respectivos países e acaba numa briguinha tipo quem vai ouvir o quê até que essa briga acaba somente quando um dos “bravos” lutadores finalmente sintoniza numa estação onde toca uma música americana, simbolizando o poder dos EUA frente aos embates do mundo e sua universalidade cultural. A pesar de Munique ser um filme pesadão se houver perseverança por parte dos expectadores a experiência final poderá surpreender e causar impacto. RECOMENDADO.

BOA NOITE E BOA SORTE

Filme simpaticíssimo do Diretor George Clooney que trata da TV americana em meados da década de 50 onde os EUA vivia o período do Macarthismo.Mostrando que se comparado com os dias atuais, nada mudou em termos manipulativos, já tratados em filmes similares como Cidadão Kane e Um grito no escuro, por exemplo. O ator David Strathairn interpreta o âncora da TV CBS, Edward R. Murrow, que acaba perseguindo o Senador Joseph Mc Carthy por utilizar de inverdades para acusar supostos envolvidos com o Comunismo. O ponto alto do filme é a interpretação de Strathairn, ele molda seu personagem com ironia e classe fazendo o filme ganhar brilho. Outro ponto alto da película está certamente no seu roteiro, rápido, repleto de diálogos ágeis pontuados por uma fotografia linda em preto e branco na maior parte dentro do estúdio de Tv com pausas para uma fantástica Diane Reeves cantando clássicos do Jazz (TV is the thing this year, How High The moon, You Drive me crazy), acompanhada por alguns músicos. Os cortes para as partes musicais são excelentes, pois acentuam o clima de época e da Direção de Arte. O final súbito é finalizado com o chavão, Boa noite e Boa sorte, para entrarem os créditos com o a perfeita voz de Reeves acompanhada apenas por um baixo. O clima ao sairmos do cinema é de mágica nostalgia. EXCELENTE.

CAPOTE

O argumento desse filme é sobre a relação do escritor Truman Capote e sua pesquisa do assassinato de uma família numa cidade do interior do Kansas culminando em um dos grandes Best sellers americanos de todos os tempos “A sangue frio”. O Diretor Bennet Miller faz um apanhado da vida de Truman Capote enquanto este se prepara para enfrentar os assassinos pela qual necessita de informações para escrever seu livro. Como todo filme baseado em biografias, esse aqui, segue o roteiro clássico e é claro que está investindo num tema sério. A narrativa é simples, explorando closes dos personagens e principalmente a atuação de Philip Seymour Hoffman, sua interpretação de Capote é cheia de nuances. A princípio a língua dobrada e a fala arrastada dá vontade de você querer ser um dos Serial Killers do filme para matá-lo também, mas, na verdade, a sua interpretação exigiu muita técnica para ser realizada. Por vezes ele é tão controlado que parece que o ator utilizou supositórios de cafeína para extimular o corpo a interpretar, interpretar e interpretar. Entretanto, seu desempenho atinge um crescendo espetacular. No final você ri do sujeito porque não consegue que, a corte suprema execute, seus supostos “amigos” para ele concluir sua “mina de ouro”. É tão bizarro, o conceito, e os trajeitos afeminados, que o expectador não sabe se estende a mão ou sente raiva de Capote por explorar a desgraça alheia. Isso culminou na própria maldição do escritor que depois de realizar essa obra não escreveu mais nada na literatura. O filme é dirigido com sobriedade, com bela fotografia, mas uma história de um escritor que por si só é um espetáculo a parte e que vale ser conferido.